Esta manhã, sai para passear e depois fui ao supermercado com os meninos. Na fila, duas senhoras falam sobre mim e concluem o mesmo: “tem que ver como agora os homens ajudam as suas mulheres cuidando das crianças”. Esta é uma das situações que eu adoro para poder provocar um pouco e mostrar meu lado mais feminista. Mas já estava tarde, então apenas sorri, agradeci e fomos para a casa.
O que eu deveria ter dito a estas senhoras? Provavelmente, como em outras vezes, eu teria respondido com um “desculpe-me, senhora, mas não, nem ajudo nem penso ajudar a minha mulher a cuidar das crianças.” E depois explicaria-lhes o meu ponto de vista sobre isto.
Antes de ter filhos, eu nunca fui desses maridos que ajudam a sua mulher com as tarefas da casa. Mas é porque a minha mulher também nunca me ajudou em nada. E quando as crianças chegaram as coisas continuaram mais ou menos iguais: não a ajudo com a casa e agora nem com os filhos.
Pode ser que alguém ainda não tenha se dado conta do que estou falando e esteja pensando “maravilhas” sobre mim e se apiendando da minha mulher (“pobrezinha, sobra tudo para ela!”). Não, eu não ajudo a minha mulher a cuidar das crianças porque não posso ajudar a alguém com algo que é da minha inteira responsabilidade.
Os filhos, assim como as tarefas domésticas, não são patrimônio de ninguém: nem pertencem à mulher, nem ao homem. São responsabilidade de ambos. Por isso, me ofendem quando, de maneira muito bem intencionada, me agradam dizendo “o tanto que ajudo a minha mulher”. Como se não fossem meus filhos ou não fosse minha responsabilidade. Faço, com muito esforço e muito prazer, nem mais nem menos do que o que me cabe. Bem como a minha esposa. E por mais que eu me esforce, nunca poderei conseguir fazer o tanto e o tão bem como ela faz.
Por que temos esta visão das responsabilidades?
Ainda temos em mente um modelo de família patriarcal na qual há uma divisão de tarefas muito bem definida: o homem é o provedor financeiro e a mulher a gestora do lar (aí incluímos as crianças). Entretanto, a sociedade vem mudando profundamente nas últimas décadas (por sorte!) e esta divisão de papéis mudou o seu formato ao longo da história. A mulher de hoje em dia, ainda que continue sofrendo profundas discriminações sociais (é só notar a diferença de salários ou de oportunidades no mercado de trabalho) é o agente de seu próprio crescimento. Tem a capacidade de desenvolver uma carreira profissional nas mesmas áreas que um homem e, se decide dedicar-se para cuidar dos filhos é, na maioria das vezes, por uma escolha pessoal, e não por falta de oportunidades ou direitos sociais.
Em um momento em que temos esta igualdade de papéis entre homens e mulheres, assumir de fato que os filhos são responsabilidade delas é um vestígio do passado. Hoje em dia, homem e mulher dividem (ou deveriam fazê-lo) de modo equilibrado aquelas tarefas que cabem aos dois, como a casa e os filhos. E o que é “de modo equilibrado”? Esse equilíbrio não implica em (quase) nenhum caso a divisão de 50- 50, mas em uma adaptação flexivel entre a disponibilidade dos membros da família e as tarefas que existem. Pensamos, por exemplo, que injusto seria uma divisão de tarefas 50-50 em um caso em que a mulher chega à casa às 20h, depois de 12 horas de trabalho, e seu esposo está em casa desde o meio-dia. Uma divisão “metade eu, metade você” seria tremendamente injusta. O mesmo acontece ao contrário.
Os filhos implicam em dar um passo em direção a esta flexibilidade e supõem um importante exercício de compenetração e trabalho em equipe do casal.
Quais são as tarefas referentes ao pais e quais são as da mãe?
Bom, por ser mãe (por motivos óbvios) ela se encarrega da amamentação, o resto das quase inumeráveis tarefas relacionadas aos filhos não são exclusivas de ninguém, são totalmente passíveis de trocas entre pai e mãe de acordo com as circunstâncias, preferências (deles ou dos filhos – “hoje quero dormir com a mamãe/ quero dormir com o papai”) ou as habilidades de cada um.
Uma boa divisão de tarefas é aquele que é equilibrada, justa, que não gera conflitos e que permite um desenvolvimento harmonioso da rotina doméstica.
Que modelo quero transmitir aos meus filhos?
Quero que meus filhos cresçam sem saber que passar a roupa é coisa de homens ou de mulheres. Que não saibam se cuidar dos banheiros é função do pai ou da mãe. Que não associem o fogão, nem o aspirador, nem dobrar a roupa ou arrumar os armários como trabalho de ninguém específico. Que procurem com mais ou menos uma frequência igual ou um ou o outro para dormir, contar suas confidências, brincar ou se aborrecer.
Que não haja um chefe da casa, pois todos convivemos do modo mais feliz possível.
Assim que, não, senhora, eu não ajudo a minha mulher a cuidar das crianças. Muito menos com a casa. Estou com eles no supermercado e passeio com eles porque são os meus filhos e me acompanham aonde eu vou.
Eu troco as suas fraldas, dou banho, levo-os ao parque ou faço a comida para eles não porque ajudo a minha mulher, mas porque são meus filhos, são minha responsabilidade e quero que cresçam com um modelo de família e de divisão de tarefas diferente daquela que a senhora e eu tivemos.
Alberto Soler
Traduzido e adaptado de http://www.albertosoler.es em 24/01/16.
Nana.